6 dias sem desodorante
6 dias sem usar desodorante. Meu desodorante acabou, fiz uma lista de itens em falta no meu arsenal cotidiano de um ser humano urbano, e algo a mais, como pequenos desumidificadores. Bolor, você me causa dor, pelo menos quando está em minhas roupas e bags dos meus instrumentos musicais.
Desodorante, desumidificadores, flanelas, lustra móveis, bananas, essa é a lista. Vou até o mercado e compro tudo, menos o desodorante. Me dei conta quando retornei ao lar, e é fim do dia, a chegada da minha insônia está próxima (minha insônia trabalha num sistema de rotação lunar, gira em torno de si mesma enquanto completa translações à minha volta), não precisarei de desodorante mais hoje. E em caso de saída emergencial, tenho polvilho granado, água, sabonete e roupas limpas, condições ideais pra me arrumar para uma entrevista de emprego, ou 12, e depois de falhar em todas, tomar um banho pra tentar esquecer um pouco de minha própria existência, enquanto a água escorre no rosto, que fica escondido como uma caverna coberta por cataratas de shampoo. Não voltei pra comprar desodorante esta noite, nem na seguinte, nem na próxima, ou na manhã que seguiu, fui na base do granado, como se meu sovaco fosse viciado em cocaína de polvilho, Pablo Granado Escobar.
Mesmo com banho, sabonete e granado, comecei a sentir um cheiro engraçado, enquanto sentado com meu violão, treinando um dedilhado. Um cheiro forte, que não tem medo ou receio de existir, um cheiro que não se deixa ser ignorado, um cheiro com personalidade, tudo que eu não tenho. Um odor me atinge as narinas e pinta as paredes do cérebro, como sangue espirrando numa porta branca em um filme do Tarantino. Me acostumei com sua presença, acreditei que ele me tornava mais forte e original, não me escondo mais atrás do DES em desodorante, chega de des. Sem desodorante, sem desistir.
Desodorante, desumidificadores, flanelas, lustra móveis, bananas, essa é a lista. Vou até o mercado e compro tudo, menos o desodorante. Me dei conta quando retornei ao lar, e é fim do dia, a chegada da minha insônia está próxima (minha insônia trabalha num sistema de rotação lunar, gira em torno de si mesma enquanto completa translações à minha volta), não precisarei de desodorante mais hoje. E em caso de saída emergencial, tenho polvilho granado, água, sabonete e roupas limpas, condições ideais pra me arrumar para uma entrevista de emprego, ou 12, e depois de falhar em todas, tomar um banho pra tentar esquecer um pouco de minha própria existência, enquanto a água escorre no rosto, que fica escondido como uma caverna coberta por cataratas de shampoo. Não voltei pra comprar desodorante esta noite, nem na seguinte, nem na próxima, ou na manhã que seguiu, fui na base do granado, como se meu sovaco fosse viciado em cocaína de polvilho, Pablo Granado Escobar.
Mesmo com banho, sabonete e granado, comecei a sentir um cheiro engraçado, enquanto sentado com meu violão, treinando um dedilhado. Um cheiro forte, que não tem medo ou receio de existir, um cheiro que não se deixa ser ignorado, um cheiro com personalidade, tudo que eu não tenho. Um odor me atinge as narinas e pinta as paredes do cérebro, como sangue espirrando numa porta branca em um filme do Tarantino. Me acostumei com sua presença, acreditei que ele me tornava mais forte e original, não me escondo mais atrás do DES em desodorante, chega de des. Sem desodorante, sem desistir.
-lembrando que vivenciei essa experiência sem sair de casa, foi durante o processo de composição do meu novo álbum, que sai em dezembro. Então nesse texto, não há coadjuvantes sendo incomodados pela explosão de aromas que estava acontecendo em mim, que tem sido minha aura catártica de auto aceitação
Quinto dia: estou escrevendo a letra de uma música do álbum novo, em minha cadeira de rodinhas dentro do meu estúdio, em frente a uma mesa de concreto moldada na parede, que também é de concreto e tijolos, um lugar rústico(antigamente esse espaço era um ateliê de cerâmicas). Comecei a sentir o mesmo cheiro, porém sob outra perspectiva. Cheguei à conclusão, que a meu ver(cheirar): o odor que vem da minha axila sem usar nenhum tipo de desodorante(além do polvilho), me remete a feijão queimado, aquela hora que você esquece o feijão no fogo aceso, começa a queimar e grudar no fundo da panela, é esse cheiro, e não me incomoda.
Mas desde então, toda vez que sentia, ficava alerta, como se houvesse alguma panela a ser tirada as pressas do fogo. Comecei a ficar perturbado.
Numa madrugada, acordei pra ir ao banheiro, estiquei o braço pra apertar a descarga, o cheiro subiu ao rosto, cujo as pálpebras estavam quase encostadas, e ao atingir o nariz, os olhos esbugalharam, a boca foi abrindo como um portão, do estômago subiu um vendaval de bafo, vociferando o grito que veio: FEIJÃO!
Na manhã do sexto dia, decidi que esse seria o nosso último juntos, eu e o cheiro. Passei nossas horas finais sem camisa, cozinhei feijão, induzindo uma hamonização aromática na cozinha, dancei valsa comigo mesmo no curto espaço entre a pia o armário suspenso na parede(onde guardo o pó de café, coador e filtro). De forma crescente, o apito da panela de pressão se fez presente, e finalizei a valsa, abrindo os braços em cruz, comecei a rodopiar aumentando a velocidade gradualmente, acompanhando o crescer do apito. Na última rodopiada, vi meu reflexo na parede metálica da panela, e fiz contato visual com ele. Enxerguei ali, outro eu, um que aprendeu a se aceitar, e entendeu o saco de carne, órgãos e ossos que sou(mos). Uma máscara para viver numa zona de conforto por até 48 ou 72hrs. E quando quando não restar mais nada, estivermos nus e crus, sem tempo para tabus sobre eu, tu, nos, vos, eles e seus cus, haverá apenas nosso cheiro bruto, como uma única atmosfera. E eu vi tudo isso ali, no reflexo. Terminei minha última ciranda em 360. E ainda tonto, desliguei o fogo. A orquestra gasosa comprimida silenciou, minha cabeça foi parando de girar, como um carrossel em sua última viagem, e eu estava com fome e decidido: Aprendi minha lição, porém, não aguento mais a pressão de sentir o cheiro, e pensar que em algum lugar, uma panela vai estourar.
Banho tomado, estômago cheio, pensamento formado, vou comprar desodorante no mercado. Mas antes, farei uma lista.
Mas desde então, toda vez que sentia, ficava alerta, como se houvesse alguma panela a ser tirada as pressas do fogo. Comecei a ficar perturbado.
Numa madrugada, acordei pra ir ao banheiro, estiquei o braço pra apertar a descarga, o cheiro subiu ao rosto, cujo as pálpebras estavam quase encostadas, e ao atingir o nariz, os olhos esbugalharam, a boca foi abrindo como um portão, do estômago subiu um vendaval de bafo, vociferando o grito que veio: FEIJÃO!
Na manhã do sexto dia, decidi que esse seria o nosso último juntos, eu e o cheiro. Passei nossas horas finais sem camisa, cozinhei feijão, induzindo uma hamonização aromática na cozinha, dancei valsa comigo mesmo no curto espaço entre a pia o armário suspenso na parede(onde guardo o pó de café, coador e filtro). De forma crescente, o apito da panela de pressão se fez presente, e finalizei a valsa, abrindo os braços em cruz, comecei a rodopiar aumentando a velocidade gradualmente, acompanhando o crescer do apito. Na última rodopiada, vi meu reflexo na parede metálica da panela, e fiz contato visual com ele. Enxerguei ali, outro eu, um que aprendeu a se aceitar, e entendeu o saco de carne, órgãos e ossos que sou(mos). Uma máscara para viver numa zona de conforto por até 48 ou 72hrs. E quando quando não restar mais nada, estivermos nus e crus, sem tempo para tabus sobre eu, tu, nos, vos, eles e seus cus, haverá apenas nosso cheiro bruto, como uma única atmosfera. E eu vi tudo isso ali, no reflexo. Terminei minha última ciranda em 360. E ainda tonto, desliguei o fogo. A orquestra gasosa comprimida silenciou, minha cabeça foi parando de girar, como um carrossel em sua última viagem, e eu estava com fome e decidido: Aprendi minha lição, porém, não aguento mais a pressão de sentir o cheiro, e pensar que em algum lugar, uma panela vai estourar.
Banho tomado, estômago cheio, pensamento formado, vou comprar desodorante no mercado. Mas antes, farei uma lista.
Fim